quinta-feira, 16 de novembro de 2017

QUINTA DE POESIA







A CASA

Sei dos filhos
pelo modo como ocupam a casa:
uns buscam os recantos,
outros existem à janela.

A uns satisfaz uma sombra,
a outros, nem o mundo basta.
Uns batem com a porta,
outros hesitam como se não houvesse saída.

Raras vezes, sou pai.
Sou sempre todos os meus filhos,
sou a mão indecisa no fecho,
sou a noite passada entre relógio e escuro.

Em mim ecoa a voz
que, à entrada, se anuncia: cheguei!
e eu sorrio, de resposta: chegou?
Mas se nunca ninguém partiu...

E tanto em mim
demoraram as esperas
que me fui trocando por soalho
e me converti em sonolenta janela.

Agora, eu mesmo sou a casa,
essa infatigável casa
a que meus filhos
eternamente regressam.

 MIA COUTO



Foto: minha



2 comentários:

MT disse...

Maravilhosa poesia, como tudo o que Mia Couto escreve!

MARIA ARACI disse...

Maria Tereza: ele nos toca fundo, não é?!